quinta-feira
6 agoEm que consiste a Teoria Poliédrica da Empresa e como ela foi adotada no Brasil?
Nos moldes do ensinamento do eminente professor Ricardo Negrão[1], ao tratar sobre os perfis da empresa, leciona que o conceito poliédrico desenvolvido por Alberto Asquini (Itália) concebe quatro perfis à empresa, visualizando-a, como objeto de estudos, por quatro aspectos distintos, a saber: a) perfil ou aspecto subjetivo; b) perfil ou aspecto objetivo; c) perfil ou aspecto funcional; e d) perfil ou aspecto corporativo ou institucional.
O aspecto subjetivo consiste no estudo da pessoa que exerce a empresa, ou seja, a pessoa natural (empresário individual) ou a pessoa jurídica (sociedade empresária) que exerce atividade empresarial.
O aspecto objetivo foca-se nas coisas utilizadas pelo empresário individual ou sociedade empresária no exercício de sua atividade. São os bens corpóreos e incorpóreos que instrumentalizam a vida negocial. Em suma, consiste no estudo da teoria do estabelecimento empresarial.
Já o aspecto funcional, refere-se à dinâmica empresarial, isto é, a atividade própria do empresário ou da sociedade empresária, em seu cotidiano negocial. Nesse aspecto, empresa é entendida como exercício da atividade (complexo de atos que compõem a vida empresarial).
Finalmente, o aspecto corporativo ou institucional estuda os colaboradores da empresa, empregados que, com o empresário, envidam esforços à consecução dos objetivos empresariais.
Pelo fato do aspecto corporativo submeter-se às regras da legislação laboral no direito brasileiro, o professor Ricardo Negrão prossegue ministrando que Waldírio Bulgarelli prefere dizer que, no Brasil, a Teoria Poliédrica da Empresa foi reduzida à Teoria Triédrica da Empresa, abrangendo tão-somente os perfis subjetivo, objetivo e funcional, que interessam à legislação civil.
Partindo desses elementos, Waldírio Bulgarelli define empresa como atividade econômica organizada de produção e circulação de bens e serviços para o mercado, exercida pelo empresário, em caráter profissional, através de um complexo de bens.
Leciona Cruz que:
“A definição do conceito jurídico de empresa é até hoje um problema para os doutrinadores do direito empresarial. Isso se dá porque empresa, como bem lembrou Asquini, é um fenômeno econômico que compreende a organização dos chamados fatores de produção: natureza, capital, trabalho e tecnologia.
Transposto o fenômeno econômico para o universo jurídico, a empresa acaba não adquirindo um sentido unitário, mas diversas acepções distintas. Daí porque o referido jurista italiano observou a empresa como um fenômeno econômico poliédrico, com quatro perfis distintos quando transposto para o Direito: a) o perfil subjetivo, pelo qual a empresa seria uma pessoa (física ou jurídica, é preciso ressaltar), ou seja, o empresário; b) o perfil funcional, pelo qual a empresa seria uma ‘particular força em movimento que é a atividade empresarial dirigida a um determinado escopo produtivo’, ou seja, uma atividade econômica organizada; c) o perfil objetivo (ou patrimonial), pelo qual a empresa seria um conjunto de bens afetados ao exercício da atividade econômica desempenhada, ou seja, o estabelecimento empresarial; e d) o perfil corporativo, pelo qual a empresa seria uma comunidade laboral, uma instituição que reúne o empresário e seus auxiliares ou colaboradores, ou seja, ‘um núcleo social organizado em função de um fim econômico comum’.” [2]
Como esse assunto foi cobrado em prova
Disserte sobre as Manifestações da “Empresa” nos ramos do Direito Brasileiro (Prof. Márcio Guimarães).
Conceituada ou não a empresa, o direito positivo brasileiro formulou critérios e noções para deles se valer em seus propósitos, conforme veremos a seguir:
A primeira manifestação do conceito jurídico de empresa dá-se no Direito do Trabalho, fundamentalmente no art. 2º do Decreto-Lei n.º 5.452/43 — Consolidação das Leis do Trabalho.
Na opinião do Prof. José Gabriel Assis de Almeida a definição do art. 2º da CLT acolhe de modo praticamente perfeito, por parte do Direito, a noção econômica de empresa uma vez que a destaca como atividade econômica e enquanto entidade responsável pelos riscos dessa atividade econômica.
Manifesta-se também no Direito Tributário a noção jurídica de empresa quando dispõe no caput do art. 132 da Lei n.º 5.172/66 — Código Tributário Nacional – sobre a responsabilidade da pessoa jurídica que resulta da fusão, transformação ou incorporação, pelos tributos devidos pelos antecessores.
O disposto no artigo supramencionado é claro no sentido da existência de uma figura jurídica que estava associada a uma empresa. Essa figura jurídica desaparece, mas o desaparecimento não causa a “morte” da empresa que continua como entidade autônoma, com vida jurídica própria, respondendo por atos pretéritos.
Outra manifestação jurídica da empresa ocorre no âmbito do Direito da Concorrência, no texto da antiga Lei n.º 4.137/62, que em seu art. 6º ampliou o conceito de empresa às atividades civis.
Na atual lei de defesa da concorrência, Lei nº 8.884/94, conhecida também como Lei Antitruste, o conceito de empresa define-se pelo conteúdo econômico da atividade e não pela forma jurídica adotada.
De acordo com o Prof. José Gabriel Assis de Almeida, esta afirmação obedece a dois parâmetros apresentados na lei dispostos nos artigos 15 e 20. O primeiro define a empresa pela negativa, ou seja, a empresa independe da estrutura jurídica que revestir. O segundo diz que qualquer estrutura jurídica que seja capaz de produzir os comportamentos visados neste artigo será considerada uma empresa.
Por meio da Lei n.º 8.078/90 verifica-se a manifestação da empresa no Direito do Consumo com a definição de “fornecedor” no art. 3º desse diploma legal.
Mais uma vez, a definição se dá pelo exercício de atividade de natureza econômica — fornecedor é quem desenvolve a atividade econômica.
A forma jurídica é meramente acessória, uma vez que a empresa pode ser pública ou privada, tratar-se de pessoa natural ou de pessoa jurídica e ter nacionalidade brasileira ou estrangeira.
Na concepção do Direito Processual Civil, a empresa se aproxima da figura jurídica do estabelecimento comercial — perfil funcional de Asquini.
A Lei n.º 8.934/94, que
disciplina o Registro Público de Empresas Mercantis, em seu artigo primeiro e
incisos, utiliza o termo empresa como sinônimo de Empresário ou de Sociedade
Empresária, portanto dentro do perfil subjetivo de Asquini. Analisando os
conceitos acima, vimos que a norma positiva não adotou um conceito geral de
empresa, aplicando-a de forma fracionada, ou seja, de acordo com a necessidade
de cada situação legal.
[1] NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Empresarial – 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
[2] CRUZ, André Santa. Direito Empresarial – 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2019.
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