sexta-feira
7 agoCompra e Venda – restrições à autonomia privada
Restrições à autonomia privada na compra e venda
A autonomia privada contratual não é sempre soberana, e encontra limitações na ordem pública, expressando o princípio da função social dos contratos. Não é diferente quando falamos em compra e venda, havendo limitações quanto ao conteúdo do negócio, sob pena de sua nulidade, anulabilidade ou ineficácia da avença. [1]
Venda de ascendente a descendente – As transações jurídicas entre ascendentes e descendentes recebem especial atenção, pois podem gerar prejuízos à legítima dos herdeiros em futura sucessão. Dessa forma, de acordo com Cristiano Chaves, “apesar de não estar expressamente mencionado no artigo, necessário que se demonstre o efetivo prejuízo, visto que, do contrário, a anulação poderia se consubstanciar em simples ato emulativo da parte daquele que foi preterido na aquisição”. [2]
Portanto, para que a transmissão onerosa entre ascendentes e descendentes seja válida, é necessário que todos os demais descendentes (juntamente com seus respectivos cônjuges) e o cônjuge do alienante consinta. [3]
Atenção: os cônjuges referidos somente não necessitarão assentir se o regime de
bens for o da separação obrigatória. Na comunhão total, em regra, o cônjuge do
alienante não será anuente, mas sim alienante de coisa comum. [4]
Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.
Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória.
Enunciados das jornadas de direito civil
Enunciado 545 – O prazo para pleitear a anulação de venda de ascendente a descendente sem anuência dos demais descendentes e/ou do cônjuge do alienante é de 2 (dois) anos, contados da ciência do ato, que se presume absolutamente, em se tratando de transferência imobiliária, a partir da data do registro de imóveis.
Enunciado 177 – Art. 496: Por erro de tramitação, que retirou a segunda hipótese de anulação de venda entre parentes (venda de descendente para ascendente), deve ser desconsiderada a expressão “em ambos os casos”, no parágrafo único do art. 496.
Enunciado 368 – Art. 496.0 prazo para anular venda de ascendente para descendente é decadencial de dois anos (art. 179 do Código Civil).
Jurisprudência
Compra e venda. Imóvel. Ascendente. Descendente.
Trata-se de ação anulatória de venda de imóvel urbano em que a alienação foi
realizada entre o pai dos autores (irmãos por parte de pai) e o neto (filho de
outro irmão por parte de pai já falecido). O entendimento doutrinário e
jurisprudencial majoritário considera, desde o CC/1916 (art. 1.132), que a
alienação feita por ascendente a descendente é ato jurídico anulável, sendo que
essa orientação se consolidou de modo expresso no novo CC/02 (art. 496). No
caso dos autos, regido pelo CC/1916, não há dúvida a respeito dos três
requisitos objetivos exigidos, ou seja, o fato da venda, a relação de
ascendência e descendência entre vendedor e comprador e a falta de
consentimento dos outros descendentes, o que já demonstra presente a nulidade.
Os demais requisitos, a configuração de simulação ou, alternativamente, a
demonstração de prejuízo, que também estão presentes no caso, são resultantes
da evolução da doutrina e jurisprudência, mas ainda sob a regência do CC/1916.
Assim, o que era de início apenas anulável consolidou-se nos autos como nulo,
devendo subsistir o julgamento do TJ de que a transmissão de bens do ascendente
ao descendente, se onerosa, deverá obedecer ao mandamento contido no art. 1.132
do CC/1916 e, em seguida, obrigará o donatário a colacionar, no inventário,
aquilo que recebeu (art. 1.785 do CC/1916). REsp 953.461, rei. Min. Sidnei
Beneti, 14.6.11.3aT. (Info 477,2011)
[1] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Volume único. Editora JusPodivm. 2020.
[2] FARIAS, Cristiano Chaves de. et. al. Código Civil para concursos – 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2020.
[3] FARIAS, Cristiano Chaves de. et. al. Código Civil para concursos – 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2020.
[4] FARIAS, Cristiano Chaves de. et. al. Código Civil para concursos – 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2020.
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