Direito Constitucional- Eficácia e Aplicabilidade das Normas Constitucionais
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Direito Constitucional- Eficácia e Aplicabilidade das Normas Constitucionais

A Constituição – entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, criada pela vontade soberana do povo, que determina a organização político-jurídica do Estado e dispõe sobre seus elementos essenciais – durante muito tempo, não eram vista como autêntica norma jurídica, mas como mera proclamação política, desprovida de imperatividade. As constituições não eram empregadas na resolução dos casos concretos, dependendo quase sempre da mediação legislativa para a produção de algum efeito jurídico. Uma das mais importantes transformações ocorridas no Direito Constitucional contemporâneo foi a superação deste antigo paradigma. Hoje pode-se afirmar o caráter normativo da constituição.

Deste caráter normativo, temos que toda norma constitucional é obrigatória e produz efeitos mínimos. O que varia entre elas é o grau de eficácia.

A classificação que sempre é cobrada em concursos públicos é aquela do professor JOSÉ AFONSO DA SILVA. Eleclassifica as normas constitucionais em três grupos: i) normas de eficácia plena; ii) normas de eficácia contida e; iii) normas de eficácia limitada.

1) Normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata: São aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem todos os efeitos que o legislador constituinte quis regular.

As normas de eficácia plena possuem as seguintes características: a) são autoaplicáveis, é dizer, elas independem de lei posterior regulamentadora que lhes complete o alcance e o sentido; e b) são não-restringíveis, ou seja, caso exista uma lei tratando de uma norma de eficácia plena, esta não poderá limitar sua aplicação.

Art. 230. § 2º Aos maiores de sessenta e cinco anos é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos.

Art. 82. O mandato do Presidente da República é de quatro anos e terá início em primeiro de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição.

  • A norma constitucional que impõe o dever da inviolabilidade do domicílio, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial, é exemplo de norma constitucional de eficácia plena.
  • As normas que estabelecem o mandado de segurança, o habeas corpus, o mandado de injunção e o habeas data.
  • A norma constitucional que garante a igualdade de todos perante a lei é uma norma de eficácia plena, pois, embora seu caráter seja de norma principiológica, sua aplicação é imediata e incondicionada.

JOSÉ AFONSO DA SILVA afirma que não há um critério único e seguro para identificar uma norma constitucional de eficácia plena, mas alega que, para ter eficácia plena, a norma precisa ser completa, no sentido de que contenha todos os elementos e requisitos para a sua incidência direta.

2) Normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata: São normas que estão aptas a produzir todos os seus efeitosdesde o momento da promulgação da Constituição, mas que podem ser restringidaspor parte do Poder Público.

As normas de eficácia contida possuem as seguintes características: a) são autoaplicáveis, é dizer, elas independem de lei posterior regulamentadora que lhes complete o alcance e o sentido; e b) são restringíveis, isto é, estão sujeitas a limitações ou restrições, que podem ser impostas por uma lei.

Art.5º, inciso XIII, da CF/88, segundo o qual “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. Citamos, por exemplo, a exigência de aprovação no exame da OAB como pré-requisito para o exercício da advocacia

Art. 5º, inc. LVIII – O civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei.

  • O direito fundamental à liberdade de crença é norma de eficácia contida, pois, conforme a CF, a lei pode impor o cumprimento de prestação alternativa no caso de a crença ser invocada contra dispositivo legal.
  • Conforme o inciso VII do artigo 5.º da CF, “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”.
  • Dada a presença da expressão “nos termos da lei”, em “São direitos dos trabalhadores (…) aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei”, é correto afirmar que esse dispositivo constitucional é norma constitucional de eficácia contida.

JOSÉ AFONSO observa que essas normas podem ser a aplicabilidade restringida por certos conceitos indeterminados, tais como “ordem pública”, “segurança nacional”, “necessidade ou utilidade pública”, entre outros, que importam contenções da eficácia normativa. Ademais, sua eficácia pode ainda ser afastada pela incidência de outras normas constitucionais, se ocorrerem certos pressupostos de fato (estado de sítio, por exemplo).

  • A norma constitucional que consagra a liberdade de reunião é norma de eficácia contida, na medida em que pode sofrer restrição ou suspensão em períodos de estado de defesa ou de sítio, conforme previsão do próprio texto constitucional.

3) Normas constitucionais de eficácia limitada: São aquelas que dependem de regulamentação futura para produzirem todos os seus efeitos e se aplicarem a casos concretos. São, portanto, de aplicabilidade mediata e reduzida, também chamada de aplicabilidade indireta ou diferida. Não possuem aplicabilidade imediata.

As normas constitucionais de eficácia limitada possuem a seguinte característica: são não-autoaplicáveis, ou seja, dependem de complementação legislativa para que possam produzir todos os seus efeitos.

Art. 32, § 4º Lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito Federal, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar. Para que este direito possa ser exercido, faz-se necessária a edição de lei ordinária que o regulamente. Assim, enquanto não editada essa norma, o direito não pode ser usufruído.

Art. 37, inciso VII, da CF/88, que trata do direito de greve dos servidores públicos (“o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”).

  • O direito à educação, previsto pela Constituição Federal de 1988, é norma de direito fundamental de eficácia limitada, pois necessita da atuação do legislador para produzir todos os seus efeitos.
  • Art. 7º, XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei.

*Atenção: As normas de eficácia limitada subdividem-se em dois grupos. As normas de eficácia limitada de princípio institutivo preveem a criação de um órgão ou pessoa jurídica. Traçam as linhas gerais de organização e estruturação de órgãos e entidades, mas não são suficientes para lhes conferir existência imediata.

  • Art. 37, XIX (“somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação”)
  • Art. 18, § 2º (“Os Territórios Federais integram a União, e sua criação, transformação em Estado ou reintegração ao Estado de origem serão reguladas em lei complementar”).

Já as normas de eficácia limitada de princípio programático estabelecem objetivos e metas a serem alcançados no futuro, impondo uma tarefa para os poderes públicos.

  • Art. 3º, I, que impõe como objetivo fundamental da República “construir uma sociedade livre, justa e solidária”.
  • As normas programáticas, que veiculam princípios a serem cumpridos pelo Estado, podem ser exemplificadas, entre outras, pela previsão constitucional de proteção ao mercado de trabalho da mulher mediante incentivos específicos.

É importante destacar que as normas de eficácia limitada, embora tenham aplicabilidade reduzida e não produzam todos os seus efeitos desde a promulgação da Constituição, possuem eficácia jurídica. Guarde bem isso: a eficácia dessas normas é limitada, porém existente! Diz-se que as normas de eficácia limitada possuem eficácia mínima.

Diante dessa afirmação, cabe-nos fazer a seguinte pergunta: quais são os efeitos jurídicos produzidos pelas normas de eficácia limitada?

Efeitos mínimos produzidos pelas normas constitucionais de eficácia limitada:

As normas de eficácia limitada produzem imediatamente, desde a promulgação da Constituição, dois tipos de efeitos: i) efeitos negativos; e ii) efeitos vinculativos ou positivos.

Efeitos negativos:

  1. revogam a legislação pretérita incompatível (força revogante);
  2. proíbem a edição de leis posteriores que se oponham a seus comandos. Caso elas sejam editadas, serão inconstitucionais (força impeditiva);

Efeitos positivos:

  • criam deveres para o legislador, servindo de parâmetro para a inconstitucionalidade por omissão;
  • orientam a aplicação e a interpretação das normas infraconstitucionais pelo Poder Judiciário;
  • condicionam a atividade discricionária da Administração Pública;
  • geram direitos subjetivos aos seus destinatários.

Normas constitucionais de eficácia exaurida ou esgotada:

Para DANIEL SARMENTO, haveria ainda um quarto grupo a ser acrescido à classificação de José Afonso da Silva: o das normas constitucionais de eficácia exaurida ou esgotada. Ex.: ADCT, Art. 4º. “O mandato do atual Presidente da República terminará em 15 de março de 1990.” São normas que não mais apresentam eficácia jurídica, tampouco eficácia sociológica, porque já esgotaram seus efeitos.

Normas com eficácia absoluta:

 MARIA HELENA DINIZ, além de propor algumas alterações terminológicas, acrescentou à lista do prof. José Afonso da Silva mais uma espécie de norma, correspondente às cláusulas pétreas, que não podem ser restringidas nem mesmo por emenda constitucional. Assim, propõe e explicar que são normas constitucionais de eficácia absoluta “as intangíveis; contra elas nem mesmo há o poder de emendar. (…) Distinguem-se, portanto, das normas constitucionais de eficácia plena, que, apesar de incidirem imediatamente sem necessidade de legislação complementar posterior, são emendáveis.” (DINIZ, Norma constitucional e seus efeitos, p. 98-103).

Preâmbulo:

Em síntese, o preâmbulo:

  • Serve para definir as intenções do legislador constituinte, proclamando os princípios da nova constituição e rompendo com a ordem jurídica anterior;
  • Segundo o Supremo Tribunal Federal, ele não é norma constitucional (ADI 2.076);
  • Não dispõe de força normativa;
  • A doutrina não o considera juridicamente irrelevante, uma vez que deve ser uma das linhas mestras interpretativas do texto constitucional (vetor interpretativo das normas constitucionais);
  • O próprio STF, em decisões subsequentes, invoca o preâmbulo como reforço argumentativo para a adoção de posições favoráveis à proteção de direitos fundamentais (RMS 26.071; HC 94.163; ADI 3.510).
  • O STF também confirmou que a invocação de Deus no preâmbulo não enfraquece a laicidade do Estado brasileiro: “Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa.” (ADO 2.076 e MS 24.645/DF-MC).
  • Ele não é considerado parâmetro para declarar a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade normativa.

Parte transitória. Visa integrar a ordem jurídica antiga à nova, quando do advento de uma nova Constituição, garantindo a segurança jurídica e evitando o colapso entre um ordenamento jurídico e outro (ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).

Suas normas são formalmente constitucionais, embora, no texto da CF/88, apresente numeração própria, e, por isso, apresentam as mesmas características das normas contidas no corpo permanente da CF:

  • Podem ser modificadas por reforma constitucional (emendas constitucionais).
  • Podem trazer exceções às regras colocadas no corpo da Constituição.
  • Podem, inclusive, ser objeto de controle de constitucionalidade.

Resumo Esquematizado Direito Constitucional. Instituto Fórmula, 2021.

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