terça-feira
24 novDireito Civil- Usucapião de Bens Públicos
É certo que a Constituição, em seus artigos 183, §3º e 191, parágrafo único, bem como o Código Civil, no artigo 102, proíbem expressamente a usucapião de imóveis públicos urbanos ou rurais. Também neste sentido entendem a doutrina e a jurisprudência majoritárias dos tribunais superiores[1].
Apesar disto, há juristas, como é o caso de Sílvio Rodrigues, Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald e, parcialmente, Flávio Tartuce, que defendem a possibilidade de usucapião de bens públicos desde que esta atinja os bens públicos dominicais (terras devolutas)[2].
O argumento utilizado é que, sendo alienáveis, tais bens seriam prescritíveis e usucapíveis. Leva-se em conta, ademais, o princípio da função social da propriedade, que poderia ser aplicável aos bens públicos, visto que muitas vezes, o Estado não atenderia ao regramento constitucional quando do exercício de seu domínio.[3][4]
Há julgados estaduais que já admitem a usucapião de terras devolutas. São exemplos: TJSP, Apelação 991.06.028414-0, Acórdão 4576364, Presidente Epitácio, 19.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Mário de Oliveira, j. 08.06.2010, DJESP 14.07.2010; e TJSP, Apelação 991.04.007975-9, Acórdão 4241892, Presidente Venceslau, 19.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Conti Machado, j. 24.11.2009, DJESP 29.01.2010)[5].
Em nível de tribunal superior, de acordo com a Afirmação nº 7, da Edição nº 133 da Jurisprudência em Teses do STJ, publicada em 2019, tem-se que “a inexistência de registro imobiliário de imóvel objeto de ação de usucapião não induz presunção de que o bem seja público (terras devolutas), cabendo ao Estado provar a titularidade do terreno como óbice ao reconhecimento da prescrição aquisitiva”. Um dos precedentes que embasaram tal conclusão assim dispõe: “esta Corte Superior possui entendimento de que a circunstância do imóvel objeto do litígio estar situado em área de fronteira não tem, por si só, o condão de torná-lo de domínio público. A ausência de transcrição no ofício imobiliário não conduz à presunção de que o imóvel se constitui em terra devoluta, cabendo ao Estado o encargo de provar a titularidade pública do bem. Precedentes” (STJ, Ag.Rg. no REsp 611.577/RS, 3.ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 20.11.2012, DJe 26.11.2012)[6].
Conclui-se que o posicionamento pode ser uma tendência, mas certamente ainda não consolidada[7], sendo aqui trazida para que se tenha um entendimento completo acerca do tema e da jurisprudência mais modernas. Já houve questão que acatou tal entendimento, mas esta foi anulada posteriormente pela banca. Veja:
Ano: 2018 Banca: FGV Órgão: AL-RO Cargo: Consultor Legislativo – Assessoramento Legislativo José, possuidor de área rural, propõe ação de usucapião constitucional rural, com o objetivo de ser reconhecido como seu proprietário. Sobre o caso, assinale a afirmativa correta. A usucapião pode abranger áreas privadas e terras devolutas (GABARITO). |
[1] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
[2] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
[3] ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Função social da propriedade pública. São Paulo: Malheiros, 2005.
[4] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
[5] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
[6] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
[7] TARTUCE, Flávio. Direito das coisas. Manual de Direito Civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
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